quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Estudo confirma eficácia de novo tratamento para Parkinson

Um estudo em saguis, realizado pela equipe do Centro de Primatas do Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra, e publicado pela revista americana Neuron, demonstrou a eficácia de uma nova neuroprótese no tratamento da doença de Parkinson. A nova terapia, denominada estimulação epidural da medula espinhal (EEMS), é pouco invasiva, podendo, no futuro, ser realizada sem a necessidade de internação hospitalar. 

Essa característica contrasta fortemente com um método tradicional de tratamento da doença de Parkinson - a estimulação cerebral profunda (DBS) – que envolve um procedimento cirúrgico de várias horas, ao qual podem ser submetidos apenas uma pequena fração dos pacientes parkinsonianos, devido ao caráter muito invasivo desse procedimento e os riscos associados ao mesmo. 

Os neurobiologistas do IINNELS que lideraram o projeto publicaram os seus resultados hoje (30/10/2014), na edição on-line da revista Neuron. O projeto foi liderado pelos neuroscientistas Romulo Fuentes (IINNELS) e Miguel Nicolelis (IINNELS e Duke University) e contou também com a colaboração de Per Pettersson da Universidade Lund, na Suécia. 

Depois do estudo original dos mesmos pesquisadores, realizado em roedores e publicado pela revista Science em 2009, mais de 50 pacientes parkinsonianos em todo o mundo já se beneficiaram do uso da EEMS. Os resultados desses primeiros testes clínicos têm sido extremamente encorajadores. De acordo com Romulo Fuentes, “a EEMS foi inicialmente usada no tratamento de dor crônica que não responde a medicamentos. Como alguns desses pacientes também desenvolveram a doença de Parkinson, o uso contínuo da EEMS também se mostrou eficaz no tratamento de sintomas motores produzidos por essa doença neurodegenerativa, principalmente aqueles relacionados a marcha e a postura”. 

Apesar do sucesso inicial, nenhum estudo em animais ou pacientes havia até hoje investigado os possíveis mecanismos através dos quais a EEMM produz seu efeito terapêutico em pacientes parkinsonianos. No estudo publicado hoje, os neurocientistas do IINNELS usaram uma toxina química, chamada 6-OHDA, para induzir a degeneração de neurônios produtores de dopamina em 5 saguis. Essa lesão química reproduziu, em todos os animais, as lesões observadas no cérebro de pacientes portadores de doença de Parkinson. Como consequência, todos os saguis apresentaram sintomas motores como “congelamento de movimentos”, distúrbios de locomoção, tremores, e falta de coordenação motora. 

Para estudar os mecanismos neurofisiológicos envolvidos na doença de Parkinson induzida nesses animais, matrizes de microeletrodos foram implantadas cronicamente em múltiplas estruturas cerebrais que definem o sistema motor desses primatas. A seguir, eletrodos para estimulação foram implantados nos primeiros segmentos toráxicos da medula espinhal dos mesmos animais. Imediatamente após o início da estimulação elétrica da medula espinhal, todos animais apresentaram uma melhora significativa dos seus deficit motores. Os efeitos dessa terapia foram medidos de duas formas: a primeira, realizada de forma manual, foi executada por observadores que não sabiam se os animais estavam recebendo ou não a estimulação medular. 

Esses observadores usaram uma escala para avaliar os sinais clínicos motores expressos por cada animal. Essa escala incluiu a avaliação do grau de “congelamento motor”, grau da redução de movimentos, coordenação motora, marcha, postura e capacidade de realizar movimentos motores finos. A segunda avaliação foi feita de forma automática, através da análise computacional de registros de vídeo que gravaram a movimentação dos animais. Essa análise automática revelou que a EEMS praticamente dobrou a produção de movimentos nos saguis parkinsonianos. 

Segundo Romulo Fuentes, o nível de melhora variou de animal para animal, mas todos eles demonstraram um alívio significativo do deficit motor. "Em um desses animais, que não era capaz de realizar nenhum movimento, o uso da EEMS fez com que o macaco voltasse a se movimentar normalmente. Enquanto a EEMS perdurou, esse animal foi capaz de usar as mãos para apanhar pedaços de alimentos e deglutir normalmente", disse. 

De acordo com Nicolelis, "esses dois métodos de avaliação revelaram uma melhora signficativa na capacidade de locomoção que se assemelha aos resultados obtidos em nossos estudos com roedores e numa série de estudos em que a EEMS foi testada em pacientes parkinsonianos". 

Nicolelis também ressaltou que “os saguis tratados com a EEMS demonstraram melhora importante em sintomas motores que normalmente são difíceis de serem revertidos com o método da estimulação cerebral profunda, como por exemplo os distúrbios de postura, marcha e velocidade de movimento”. 

Ao analisar os resultados obtidos com os registros neurofisiológicos, o grupo de neurocientistas do IINNELS observou que os sinais clínicos da doença de Parkinson eram acompanhados por padrões oscilatórios patológicos da atividade elétrica neural em múltiplas estruturas do sistema motor. Essas oscilações neurais patológicas foram corrigidas com o uso da EEMS, fazendo com que o sistema motor voltasse a apresentar padrões normais de atividade neural. Em uma outra série de experimentos, observou-se que o uso da droga L-DOPA, normalmente usada no tratamento inicial da doença de Parkinson, produziu o mesmo efeito de 
eliminar as oscilações patológicas neurais do sistema motor. 

“Foi realmente surpreendente observar que a EEMS produziu efeitos muito similares aqueles induzidos pelo uso da L-DOPA”, disse Fuentes. De acordo com Nicolelis, “esses experimentos foram fundamentais para estabelecer quais são os efeitos fisiológicos da EEMS num sistema nervoso que é muito mais semelhante ao cérebro humano”. “Esses estudos em primatas vão nos permitir selecionar parâmetros de estimulação que podem gerar os melhores resultados possíveis em pacientes parkinsonianos”, acrescentou Fuentes. 

De acordo com ambos os neurocientistas, o fato da EEMS ser realizada através de um processo muito menos invasivo e mais barato do que outras alternativas cirúrgicas, bem como o sucesso do uso desse método em macacos, vai contribuir para a realização de mais testes clínicos num futuro próximo. 

Como ressaltou Fuentes, "a EEMS não requer a invasão do tecido nervoso, uma vez que os eletrodos de estimulação são implantados sobre a membrana que recobre a medula espinhal”. 

Nicolelis também enfatizou que “como a EEMS requer um procedimento cirúrgico muito simples, os pacientes, no futuro, poderão se submeter ao procedimento pela manhã e deixar o ambulatório no começo da tarde”. 

Além de Petersson, Fuentes e Nicolelis, o trabalho publicado na revista Neuron é assinado por Maxwell Santana, Pär Halje, Hougelle Simplicio, Ulrike Richter, e Marco Aurélio M. Freire. Todos os experimentos desse estudo foram realizados no Centro de Primatas do IINNELS, localizado na cidade de Macaíba, Rio Grande do Norte. 

Esse trabalho foi financiado conjuntamente pelas seguintes agências: The Michael J. Fox Foundation for Parkinson’s Research; a Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) ); o Instituto Internacional de Neurociências de Natal Edmond e Lily Safra (IINNELS); o Swedish Research Council; Swedish Society for Medical Research; o Olle Engkvist, Parkinson Research, Crafoord, Åke Wiberg, Magnus Bergvall, Kockska and Segerfalk Foundation; e o National Institutes of Health (NIH).

Fonte:Tribuna do Norte

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