No palco do teatro, a arte imita a vida. Do lado de fora, nas calçadas e esquinas do cotidiano, a dureza da realidade carece da leveza artística, da sutileza poética dos versos ou da ficção das telas. Por vezes são apenas 25 centímetros de barreira. Nivelado este obstáculo, a cidadania daria um pequeno passo para a humanidade. E o cadeirante Roberto Morais passaria direto e sem tormentas ao mundo que lhe conforta: o universo dos palcos, da arte, longe dos degraus que não o levam a nada.
A dificuldade de locomoção do cadeirante na cidade começa na saída de casa, com as calçadas tão desniveladas quanto a administração pública. Até as paradas de ônibus sem acessibilidade. Depois, a espera por um transporte adaptado - são poucos. Precisa ainda da solidariedade humana, nem sempre à disposição para subir e descer. E novamente as calçadas, os batentes, os perigos e muralhas de uma cidade de pedras e buracos. Uma cidade mal adaptada - atrasada - aos direitos de todos do ir e vir, e do acesso aos bens culturais.
Roberto conhece bem alguns "muros de Berlin" interpostos entre as calçadas e o palco. O cadeirante hoje com 42 anos é paraplégico desde os 19 anos, quando levou um tiro. Aos 27 anos foi pioneiro em Natal ao se lançar dançarino e fundador (ao lado de Henrique Amoedo) de um grupo de dança apenas com cadeirantes: o Roda Viva, em 1995. Após transformar conceitos de dança e reintegração de pessoas com deficiência física para além da rotina "casa-hospital-casa", Roberto ainda sente poucas mudanças.
As leis de inclusão e acessibilidade aos cadeirantes citadas por Roberto parecem causos ou estórias de trancoso, muito contadas em cidades interioranas. São realidades distantes, quase surreais: calçadas niveladas, padronizadas; rampas de acesso para calçadas com 25 centímetros e em todos os estabelecimentos públicos; banheiros adaptados; vagas em estacionamento... "Quando há são maquiagens. No Alberto Maranhão, por exemplo, há rampa na entrada. Mas por dentro falta acessibilidade adequada, banheiros adaptados", reclama.
E o TAM ainda abriga das melhores situações. Ainda é mais elogiável o Teatro de Cultura Popular Chico Daniel (anexo à Fundação José Augusto), segundo Roberto. No Alecrim, mora um dos grandes entraves. O Teatro Municipal Sandoval Wanderley é uma muralha chinesa, a começar pelos desníveis das calçadas de acesso. "Quando somos chamados para espetáculos aqui, damos o nosso jeito e conseguimos". O "jeito", é a ajuda alheia. "Quando fiquei paraplégico fui demitido do trabalho de uma loja por invalidez. Mas não sou inválido. Faço praticamente tudo sozinho
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